segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Javista, Eloísta, Deuteronômica e Sacerdotal

Durante muitos séculos se pensou que Moisés tivesse escrito pessoalmente todo o Pentateuco. Em 1753, Astruc, médico de Luís XV (rei da França), notando que Deus era chamado, no Pentateuco, ora de “Iahweh” ora de “Elohim”, aventou a hipótese de que isso se devesse a narrações paralelas. Nascia assim a hipótese documentária. Ela passou por reformulações e sua história foi ampliando suas fronteiras em decorrência das descobertas arqueológicas, que restituirão antigos documentos assírio-babilônicos. Hoje dificilmente se encontrará um especialista que não admita que o Pentateuco seja constituído por quatro documentos, embora as pesquisas tendam, às vezes, a se diversificarem muito e a atribuição de um ou outro versículo a esta ou àquela tradição possa ser contestada.

Veremos em nosso estudo então estas quatro tradições de que se compõe o Pentateuco, a Javista, a Eloísta, a Sacerdotal e a Deuteronômica.

A tradição Javista

A tradição Javista, designada pela letra J é assim chamada porque desde o começo dá a Deus o nome de Iahweh. Ela se originou provavelmente no tempo de Salomão, em torno de 950 a.C., nos meios reais de Jerusalém. O rei ocupa nela um lugar de proeminência; é ele que faz a unidade da fé.
Ainda não se tem uma unanimidade quanto aos limites do documento Javista, mas podemos supor, com numerosos estudiosos, que ele comece em Gn 2, 4b e termine com a narração de Balaão em Nm 22; 24, incluindo a narração da falta de Israel em Baal-Fegor Nm 25, 1-5.
As narrativas da tradição Javista caracterizam-se por um vigoroso estilo de conto popular e uma pitoresca descrição de personagens.
Para o Javista, Deus envolve-se ativamente na história da humanidade e, em especial, na de Israel. O Javista começa a narrativa com a criação (Gn 2, 4b -31), apresentando a história da humanidade como o pano de fundo contra o qual o Senhor chama Abraão e lhe faz uma promessa que só o Êxodo e a conquista de Canaã realizam plenamente. O tema da promessa e concretização predomina na apresentação javista da história patriarcal.

A tradição Eloísta

A tradição Eloísta, designada pela letra E, dá a Deus o nome de Elohim. Ela nasceu talvez por volta de 750 a.C., no reino do Norte, depois que o reino unido de Davi-Salomão se dividiu em dois. Muito marcada pela mensagem de profetas como Elias e Oséias, ela dá muita importância aos profetas.
Os limites do documento Eloísta são difíceis de discernir. Podemos dizer, que o documento Eloísta começa com o ciclo de Abraão, o seu final não é fácil de ser determinado, fragmentos dele podem ser encontrados em Nm 25 e 32, mas provavelmente eles não constituem o fim primitivo dessa tradição. Alguns autores pensam que há textos Eloístas integrados no Deuteronômio.
A fonte Eloísta está tão entrelaçada com a Javista, que fica muito difícil precisar e separar as duas fontes em todas as situações. Como a fonte Eloísta ficou subordinada a Javista, o que resta da narrativa Eloísta muitas vezes está incompleto.
Na tradição Javista, temos como fundamento a benção de Deus, dada a Abraão, que será transmitida ao povo e aos povos vizinhos pela realeza, principalmente por Salomão. Já na tradição Eloísta, como o reino unido está dissolvido, a figura da realeza não tem mais a predominância, aparecendo agora a figura do Profeta e o fundamento será o temor de Deus, não como um medo de Deus, mas como uma obediência à sua Palavra.
Estas duas tradições se fundiram em Jerusalém pelos anos 700 a.C. Esta fusão, chamada Jeovista (JE), não é simples adição; ela foi a ocasião para se completarem e se desenvolverem algumas tradições, como a tradição Deuteronômica e a tradição Sacerdotal.

A tradição Deuteronômica

A tradição Deuteronômica, designada pela letra D está contida principalmente no Deuteronômio, mas influenciou outros livros. Começada no reino do Norte, foi terminada no de Jerusalém.

A tradição Sacerdotal

A tradição Sacerdotal, designada pela letra P do vocábulo alemão Priesterkodex, que quer dizer “código sacerdotal”, se originou durante o exílio em Babilônia, de 587 a 538 a.C., e depois. No exílio, os sacerdotes reliam as suas tradições para manterem a fé e a esperança do povo.
Essa obra se empenha em procurar na herança do passado uma resposta para a seguinte pergunta: em que apoiar-se para continuar a viver no meio das nações?
Insiste primeiro no pertencer a um povo, na comunidade do sangue, o que explica a importância das genealogias na história sacerdotal: trata-se de manter, por meio delas, a identidade de Israel em Babilônia a fim de evitar a dissolução do povo e permitir a Deus a realização de suas promessas.
Como não é mais possível ir ao templo (por estarem no exílio) insiste-se no sábado, como o tempo consagrado a Deus e na circuncisão, como sinal de pertencer a Israel. Com isso, já é possível uma vida religiosa; ela consiste em criar uma comunidade dirigida por um sacerdote, na qual a função do templo é desempenhada pela palavra de Deus.
Nesta tradição, a figura fundamental não será então mais o rei, nem o profeta, mas o sacerdote e o fundamento não serão mais a benção nem o temor de Deus, mas a fé e uma esperança de um tempo melhor.

Tribos do sul, de Judá, chamavam Deus por seu nome, Yahweh ou Javé. Já as tribos ao norte adotava um título mais formal, Elohim. Para resolver o problema, o editor do Gênesis contou a história dos eloístas no primeiro capítulo e dos javistas, no segundo. São duas tradições diferentes. Mais religiosos, os eloístas falavam que Deus criou o mundo em seis dias, descansando no sétimo. O homem apareceria ao lado da mulher e de outros animais no sexto dia. Mas no texto javista, Deus cria o mundo em um único dia. Depois, forma o homem que teria papel ativo para formar os elementos do mundo. Até a mulher surge depois, na história?, escreve a historiadora norte-americana Karen Armstrong em seu livro A Bíblia (Jorge Zahar Editor).

Segundo ela, seria a primeira de muitas edições do texto sagrado. Para Armstrong, eventos como o Êxodo nunca existiram. Porém, como Canaã estaria sob domínio egípcio, era necessário criar um relato que inspirasse o povo a lutar contra essa dominação. Por isso, quando a Bíblia conta que as leis mosaicas foram encontradas no templo, durante o reinado de Josias, por volta de 622 a.C., na verdade, inventaria um relato para explicar o surgimento de leis escritas na oportunidade para tornar viável a administração do reino. ?Moisés transmitiu os ensinamentos de Deus apenas oralmente. Quem escreveu textos como Deuteronômio foram os sacerdotes dos tempos de Josias, que chamamos de deuteronomistas?, sustenta Armstrong.
Em 589 a.C., Jerusalém foi invadida e arrasada pelos babilônios. A maior parte da população foi aprisionada e levada para o atual Iraque. Quando os hebreus voltaram para sua terra, décadas depois, tinham sua fé transformada, de acordo com a teoria de Armstrong. Antes eles eram politeístas e adoravam vários deuses, sendo Yahweh apenas mais um entre tantos outros como Baal, Astarote e El. Agora, após contato com os persas, Yahweh era o único Deus. Isso precisava ficar claro e, sob o comando do sacerdote Esdras, os textos foram novamente editados e enriquecidos. Teriam surgido ali os Dez Mandamentos e leis rígidas, como a proibição do casamento de hebreus com outros povos. Outras passagens, continuaram refletindo o clima de séculos de guerras com assírios e babilônios. Em vez de Deus, os autores do Antigo Testamento seriam influenciados por essa atmosfera de ódio e estariam apenas extravasando suas angústias.


Obs.: A Bíblia não é um documento científico, é um documento que contém relatos que cremos pela fé.


19 comentários:

  1. Estamos seguindo seu blog. Achamos bastante interessante, com postagens pertinentes. Se quiser nos seguir:

    http://dialogoabertoriginal.blogspot.com.br

    Juntos, seremos mais fortes. Abraço!

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  2. SÓ QUERO SABER SE O SER HUMANO É UM SER SEM ESPÍRITO, MAS O ESPÍRITO VEIO DE DEUS HEUHUE

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  3. É grande a arrogância de certos "pesquisadores" céticos em não quererem pesquisar mais a fundo. Talvez com receio de descobrirem que os relatos da Bíblia são verdadeiros. Hoje à arqueologia já tem diversas provas que a história contada no livro de Êxodo é real. Segue apenas uma fonte, mas outras muitas existem: http://ateismorefutado.blogspot.com.br/2015/01/as-provas-do-exodo.html?m=1.

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  4. parabêns, bem explicado em linguagem simples

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  5. parabêns, bem explicado em linguagem simples

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  6. Nós poderíamos acrescentar "nesta história" a tradição católica e a protestante, dentre outras.

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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  8. Como o convite foi feito abertamente aos comentaristas, sinto me no direito de expor meu pensamento aqui também. Concordo com muitas informações escritas pelo pensador deste sítio, mas gostaria de deixar minha contribuição. Esta matéria que o escritor está seguindo é um padrão de que fala o Teólogo professor de Literatura Bíblica, chefe da divisão de estudos bíblicos no Western Seminary EUA, titulado mestre pelo mesmo Seminary, doutor pelo Dallas Thological Seminary e Pastor Stanley Ellisen; quando em suas teses sobre o Antigo Testamento discorreu sobre as hipóteses documentárias que descredibilizaram a autoria do Pentateuco de sua formação original; quanto a autoria do Pentateuco de fato ser de Moisés, e, para tanto se utilizou provavelmente da hipótese documentária de Wellhausen, sabendo-se que existem outras quatro, aquela que atribui uma data muito tardia para o Pentateuco, e que para tanto teria sido escrito no período do exílio ou mais tarde. Como nos afirma Stanley E. esta já não é mais uma hipótese considerada, portanto, está ultrapassada a referida hipótese. Concluo que, a negação da autoria mosaica traz inevitavelmente o desgaste de outras doutrinas: a. É questionada a inspiração divina, pois os livros passam a ser considerados produto de maquinação religiosas, em vez de palavras diretas de Moisés, o profeta de Deus. b. A exatidão histórica das narrativas e da legislação também é desfiada, haja vista uma aparente aura de embuste que difunde-se no conjunto. Como consequência, os acontecimentos passam a ser vistos como mitos inventados por devotos da religião, em vez de história autêntica. E por final temos inúmeras confirmação que confirmam a autoria sendo do próprio Moisés e não outro em sua época não outra, e temos que: Moisés o homem mais erudito da Antiguidade e aquele que alegou ter escrito sob a direção de Deus (Êxodo 17:14, 34:27, Dt 331:9 e 24 e Atos 7:22); A unidade de conteúdo, o estilo antigo e o gênero de palavras diferenciam os livros do Pentateuco de todos os outros do A.T. Há uma continuidade óbvia de conteúdo e estilo em todos os cinco livros; Cristo e os escritores do Novo Testamento afirmam ser Moisés o autor dos cinco livros conhecidos como “A Lei” (Loao 1:17, 5:46 e 47, 7:19 e Romanos 10:5 e 19). Evidências arqueologias dignas de total credibilidade confirmam hoje atividade literária intensa antes de Moisés, pelo menos a partir da época de Abraão; quase todas as tradições judaicas reconhecem, até os tempos modernos, a autoria de Moisés; e por final, o reconhecimento de que Moisés usou no processo seletivo vários documentos antigos disponíveis é compatível com a inspiração divina, pois muitos outros escritores bíblicos admitiram essa prática. (Lucas 1:13). Obrigado e espero ter contribuído para este sítio dos pensadores no enriquecimento e valorização do Best-seller mais vendido no mundo, a Bíblia.

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  9. Boa Tarde !
    Ironman parabéns, debulhou legal as falacias dos ditos mestres da critica bíblica das veracidades do pentateuco .O referencial de Jesus e dos escritos do novo testamento fecha a questão ,alem de sua exposição qualificada, embasada e imbuída de critérios históricos,penso como você. Parabéns!!
    Osvaldo Pinheiro /Teólogo

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  10. Boa tarde!
    A história parece problemática do ponto de vista do historiador, o pentateuco não e um livro de história mas sim um livro de caráter religioso, são o testemunho de fé de um povo longo e numeroso. E este testemunho religioso que eu acho importante.
    Louvado seja nosso senhor Jesus Cristo.
    PS: gostei do post.

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  11. Querer dizer é uma coisa; Dizer e confirmar é outra.O Homem de hoje está tentando distorcer os conhecimentos Advindo das Escrituras mas quando olhamos para o passado e conseguimos Ver, houvir e escutar podemos sentir o quanto Deus falou. Is 45:7 cala qualquer pensamento.

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  12. A segurança que temos é que as Sagradas Escrituras sobrevivem debaixo de pancadaria e questionamentos. Ela resiste porque tudo o que for verdadeiro consegue suportar todos estes questionamentos. Creio que estas críticas são promovidas pelo próprio Deus, que é absolutamente soberano e independente de opiniões contrárias e sua palavra, no formato em que a vemos, é suficientemente estável e confiável para superar e sobreviver a qualquer crítica.

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  13. Protestantes, em vista da influência da Sola Scriptura , tem grandes dificuldades de encarar estudos sobre a bíblia como o apresentado. Sofrem a toa com receio de perder a base de sua fé . O cristianismo não é a religião do Livro, mas do Cristo vivo, presente entre nós

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  14. sim J costa disse tudo numa síntese perfeita porque o que interessa mesmo na construção do Reino de Deus e sua justiça é o seguimento de Jesus sua mensagem e testemunho ..o resto é comentário....

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  15. isso não contardiz a bíblia, pelo contrario foi objeto de adoração, união e evolução do povo judeu.

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  16. A lógica desse estudo é o meio de estudo histórico, e foi muito bem abordada, não descredibiliza a bíblia, pelo contrário, isso mostra o grau de atualização da palavra de Deus, como muitos gostam de mitos, querem divinizar Moisés, Paulo, Davi...Esquecem que o objetivo da bíblia é a inspiração de Deus, que usa os meios que não cabe a nós julgarmos.

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  17. O texto com letras em vermenho desestimula.

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